No último dia 27 de agosto faleceu no Noviciado Santa Teresinha do Menino Jesus nossa querida oblata Irmã Maria de Jesus Sacramentado. Religiosa fiel à fé da Igreja e a seus compromissos religiosos, pôde encontrar na Fraternidade Sacerdotal São Pio X a ajuda para conservar uma vida religiosa vivida no modo tradicional, assim como ela sempre quis viver. Daremos aqui alguns dados sobre sua vida, ao mesmo tempo em que encomendamos sua alma às orações de todos os nossos leitores.
Antes de conhecer a Fraternidade
A irmã Maria Jacinta de Jesus Sacramentado nasceu em Porto Alegre no estado do Rio Grande do Sul, Brasil, em 18 de setembro de 1920. Seus pais foram Giuseppe Morelli e Rosa de Cesari. No batismo recebeu o nome de Maria Antônia.
De sua primeira vida sabemos que já exercia a docência, desde muito jovem, pois foi contratada como professora entre o período que vai do ano de 1936 ao de 1940 (de seus 15 aos 19 anos).
Sem embargo, neste último ano de 1940, depois de exercer a docência nos meses de janeiro e fevereiro, foi exonerada de sua profissão por seu próprio pedido, levada pelo desejo de vida religiosa; esse fato nos indica que entrou na religião naquele mesmo ano de 1940.
Elegeu para isso a Congregação das Pequenas Irmãs da Divina Providência, que tinha várias casas no Brasil.
Sua tomada de hábito aconteceu, como consta por sua anotação pessoal, no dia 2 de fevereiro do ano de 1942, quando ela tinha apenas 21 anos. Fez sua primeira profissão dois anos mais tarde, em 1º de fevereiro de 1944.
Pela vida regular e exata que foi observada mais tarde nela, sua formação de noviça e sua vida religiosa foram vividas em um marco de fervor e de disciplina. Seu diretor espiritual, o Padre Ângelo Depaoli, a impelia constantemente à prática da caridade com suas irmãs, da generosidade no sacrifício, de uma vida de oração profunda, do cumprimento perfeito da vontade de Deus.
Em 1965 foi designada Superiora da casa que a Congregação tem na cidade de Itaquera: o cargo durava, segundo as Constituições, seis anos.
Em 1971 foi eleita por um segundo período de seis anos; mas aos seis meses pediu a demissão do cargo, acabrunhada por todas as reformas do Concílio, que estavam começando a introduzir-se em sua Congregação.
Fidelidade à sua vida religiosa apesar das reformas conciliares
O que a levou a tomar aquela decisão foi sobretudo, segundo o que parece, a seguinte situação vivida: em uma ocasião (devia ser no ano de 1971) o sacerdote que celebrava a Missa para a comunidade apresentou-se dizendo que, a partir desse dia, todas as Irmãs receberiam a Comunhão na mão.
No momento de receber a Comunhão ela apresentou-se, como de costume, de joelhos; o celebrante disse-lhe: “Irmã, coloque-se de pé”. Como ela continuou ajoelhada, o Padre voltou-lhe a repetir isto mesmo uma segunda vez, e logo uma terceira; a Irmã Maria Jacinta, sem dizer nada, levantou-se, fez a genuflexão e retirou-se. Não foi este o único motivo da demissão da Irmã Maria Jacinta, pois seu senso da fé a levou a sentir-se muito incomodada com as missas novas, os cantos, as palmas e os saracoteios que eram impostos às Irmãs durante as celebrações eucarísticas.
Pensando que na Argentina as coisas estivessem melhores, a Irmã Maria Jacinta pediu a mudança à casa que a Congregação tem em Buenos Aires. Aí esteve até fins de 1971; mas como também ali procedeu-se a aplicação das reformas litúrgicas, a Irmã Maria Jacinta, incomodada novamente, escreveu a Dom Antônio de Castro Mayer para pedir conselho. E o Bispo lhe aconselhou que voltasse ao Brasil.
Voltou, pois, a seu país natal em fins de 1971 (ou inícios de 1972), mas pediu a seus Superiores a faculdade de retirar-se a alguma comunidade mais contemplativa, com a esperança de encontrar aí uma situação menos grave.
Esteve com três comunidades distintas, entre os anos 1972 e 1982: primeiro em um Carmelo, no qual passou alguns anos; logo em uma comunidade religiosa fundada por um sacerdote da T.F.P.; finalmente, em uma terceira comunidade cuja identidade ignoramos.
Enquanto estava com a primeira comunidade, o Carmelo, teve uma segunda experiência desagradável da atitude inovadora dos sacerdotes: em uma quinta-feira santa, ocorreu ao sacerdote celebrante anunciar que lavaria os pés de todas as pessoas, homens e mulheres (as carmelitas, estando na clausura, ficavam excluídas; mas a Irmã Maria Jacinta encontrava-se fora da clausura, na parte dos fiéis). Desgostosa por semelhante falta de pudor e de decoro, retirou-se da igreja até que acabasse o lavatório dos pés; logo, decidiu ir-se a outra comunidade.
Conservamos, do ano de 1974 (redigido por motivo dos trinta anos de sua profissão religiosa) o regulamento de vida que a Irmã Maria Jacinta impôs-se para levar uma vida ordenada, segundo o ideal de santidade que tratava de seguir. Diz assim:
Dia 1.2.44 – 30 anos – Dia 1.2.74
Agimus tibi… Misericórdia Domino… Magnificat…
REGULAMENTO
05.00 – 05.30: Despertar. Santa Missa, Laudes, duas coroas do Rosário.
07.15: Meditação (até as 07.45).
07.50: Café da Manhã.
08.00: Visitar e medicar os asilados.
09.00: Prática do silêncio, trabalhos, farmácia.
10.50: Pequena visita, exame particular.
11.00: Almoço e visita aos enfermos.
12.30: Recreio, ou órgão, ou descanso.
14.00: Leitura, trabalho.
15.00: Prática do silêncio, merenda, trabalho.
16.00: Vésperas, meditação da noite.
16.30: Trabalho.
18.00: Jantar, remédios.
19.00: Recreio.
19.30: Coroa do Rosário na capela, tempo livre.
20.30: Oração da noite.
21.00: Descanso.
- Confissão semanal – Sexta-feira, Via Crucis – Coroa das Chagas de Nosso Senhor Jesus Cristo.
- Retiro mensal / Confissão semanal e mensal / Propósitos por escrito; balanço do mês anterior.
- Se tivesse faltado muito (penitência) um dia de jejum; se pouco, um Miserere e Stabat Mater com os braços abertos; se houve progresso, agradecer a Deus e implorar luz e forças para o mês seguinte.
- Propósito: esforçar-me por ser muito fervorosa, ser humilde e aceitar em paz e agradecida a Deus, qualquer humilhação ou sofrimento que me sobrevenha, confiando sempre no auxílio divino e na proteção e ajuda de minha Mãe do céu.
Entrada nas oblatas da Fraternidade São Pio X
Em 1982, estando na terceira comunidade, a Irmã Maria Jacinta encontrou por casualidade, enrugado dentro de uma cesta de papéis, um envelope com o endereço do Seminário de Ecône.
Ela já tinha ouvido falar de Dom Marcel Lefebvre, assim como da obra sacerdotal que tinha fundado, e sabia que tal obra contava com religiosas oblatas; mas nunca tinha conseguido o endereço.
Tendo-o agora em suas mãos, remeteu uma carta a Dom Lefebvre, pedindo-lhe ser recebida como oblata na Fraternidade Sacerdotal São Pio X. A resposta que lhe fora enviada em nome de Dom Lefebvre foi a seguinte:
“+ 28 de maio de 1982
“Irmã,
“De volta de uma longa viagem dos Estados Unidos e Canadá, Sua Excelência Dom Marcel Lefebvre foi posto em conhecimento de sua carta, e me pediu que lhe faça chegar sua resposta.
“Sua Excelência compreende perfeitamente seu desejo de unir-se à Fraternidade Sacerdotal São Pio X, para poder viver de novo sua vida religiosa de maneira tradicional.
“Como a senhora vive atualmente no Brasil, Dom Lefebvre pensa que o melhor seria que a senhora se dirigisse a Sua Excelência Dom Antônio de Castro Mayer, antigo bispo de Campos, ou ao Reverendo Padre Jean Michel Faure, Superior do Seminário da Fraternidade São Pio X em Buenos Aires, cujos endereços encontrará logo abaixo.
“Pedindo à Santíssima Virgem que a abençoe e a guie, lhe asseguramos nossas orações e nossos sentimentos respeitosamente abnegados em Nosso Senhor Jesus Cristo”.
Contudo, o desejo da Irmã Maria Jacinta era o de viajar a Europa, a Ecône se pudesse, para estabelecer-se aí com sua desejada vida religiosa. Em um novo contato com Dom Lefebvre, Sua Excelência ofereceu-lhe que fosse ao Priorado de Montalenghe, na Itália, e que aí se incorporasse em qualidade de oblata. A Divina Providência permitiu-lhe realizar esta viagem, e ali a temos até fins de 1982. Ao interar-se Dom Lefebvre de sua chegada enviou-lhe a seguinte carta:
“+ 1 de dezembro de 1982
“Querida Irmã Maria Jacinta,
“Estou muito contente de saber que chegou a Montalenghe e alegro-me de pensar que encontrou agora uma comunidade religiosa na qual poderá levar a vida de oração e de união com Deus que busca, alimentada pela verdadeira liturgia da Igreja.
“Desejo que a vida de comunidade lhe seja fácil e agradável, e que encontre na Fraternidade São Pio X os auxílios que lhe são necessários para ter uma vida religiosa fecunda, graças à vida de oração que ela lhe ajudará a praticar, em troca dos preciosos serviços que a senhora prestará ao Priorado São Carlos de Montalenghe.
“Esperando ter a alegria de conhecê-la na minha próxima passagem por Montalenghe, asseguro-lhe, caríssima Irmã Maria Jacinta, minha cordial abnegação in Christo et Maria.
“+ Marcel Lefebvre”.
Por motivo de sua primeira oblação na Fraternidade, a Irmã Maria Jacinta escreveu o seguinte ato pessoal de oblação, no qual expressa seus principais sentimentos em um momento para ela tão importante:
Adorável Trindade – Pai, Filho e Espírito Santo.
Eis-me aqui aos pés de Vosso Altar. Indigníssima como sou, atrevo-me sem embargo a elevar meus olhos a Vós, para suplicar-vos que Vos digneis receber esta minha oblação que, pelas mãos da Virgem Maria, venho fazer de minha pobre pessoa a Vossa Divina Majestade. Desejo pertencer-vos inteiramente, apesar do meu nada, de minha miséria; mas Vós sois a própria Misericórdia, a Bondade, o Amor. Por isso venho, humilde e confiada, entregar-me (renovar esta minha entrega) a Vós.
Antes de tudo Vos adoro como ao meu Soberano Senhor e Criador, Vos adoro em união com Maria Santíssima e com toda a Corte celestial. Vos agradeço pelos inumeráveis benefícios que me haveis concedido, e especialmente pela graça que hoje recebo (como Oblata da Fraternidade Sacerdotal São Pio X). Reconheço que sou grande pecadora, cheia de misérias e defeitos, incapaz de qualquer bem. Recorro a Vós, oh Trindade Santíssima, para que tenhais compaixão de mim, e me deis luzes, graças e fortaleza para conhecer bem minha miséria e jamais deixar de lutar contra meus defeitos e más inclinações. Fazei que tenha a fortaleza e a valentia para extirpar as ervas daninhas, deixando meu coração vazio de tudo e de todos, para que Vós possais ocupar-lo totalmente. Concedei-me, Vos peço, as virtudes próprias de uma religiosa: a pobreza, a castidade, a obediência, a humildade e caridade. Fazei-me simples, modesta, paciente, sincera, generosa no sacrifício, mortificada, piedosa, recolhida, silenciosa. Que Vossa Santíssima Vontade seja a norma de minha vida. Que meus pensamentos e afetos estejam sempre dirigidos a Vós – Santíssima Trindade – que vives em minha alma, Verbo humanado no Santíssimo Sacramento do altar e na Cruz. Meu Jesus Crucificado e Virgem das Dores ao pé da cruz, minha celestial patrona, sob cujo manto e proteção desejo viver e morrer. São José, meu bom Anjo da Guarda, São Miguel Arcanjo, meus santos Protetores, Anjos e todos os Santos do céu, ajudem-me. Que seja: tudo para Jesus, nada para mim.
Intenções: Almas do Purgatório, Conversão dos pecadores, Agonizantes, Santos Sacerdotes e religiosas – Fraternidade Sacerdotal São Pio X, Santa Igreja, meus parentes, amigos, benfeitores.
A Irmã Maria Jacinta, desde então, pôde viver sua vida religiosa com amparo da tradição. Entre os anos 1983-1989, permaneceu no Priorado São Carlos de Montalenghe. Em 1990 foi de volta ao Brasil, entre os sacerdotes da diocese de Campos, pois motivos de saúde não lhe permitiram permanecer na Itália. Como seus problemas de saúde prosseguiam, em 1991 tentou uma permanência no Priorado de Buenos Aires, mas logo decidiu regressar ao Brasil, para residir aí em várias casas da diocese de Campos: Comunidade de Irmãs do Bom Jesus, Comunidade de São João da Barra, etc.: tudo isso entre os anos 1992 e 1998.
Durante esses anos cabia-lhe já fazer seu compromisso definitivo como Oblata da Fraternidade São Pio X. Pediu para fazer o compromisso no ano de 1994, como lhe correspondia; mas pelo fato de encontrar-se então fora das casas da Fraternidade, o Superior Geral, Dom Fellay, creu mais conveniente diferir o compromisso até o momento em que pudesse viver em uma das casas da Fraternidade. É assim que em 1998 a Irmã Maria Jacinta regressou ao Priorado de Buenos Aires, e no ano 2000, na festividade de Nossa Senhora Corredentora, emitiu sua Oblação definitiva, no Noviciado Santa Teresinha do Menino Jesus, recebendo sua Oblação o Padre Arturo Vargas. Ali mesmo Deus lhe daria a graça de entregar-lhe santamente sua alma.
A Irmã Maria Jacinta, diga-se de passagem, já conhecia muito bem o Noviciado de nossas Irmãs em Pilar, já que desde 1992 passava parte de suas férias de janeiro nesta casa religiosa, levada pelo desejo de ter um pouco mais de regularidade religiosa durante alguns dias; e depois de voltar a Buenos Aires em 1997, ia a cada ano ao Noviciado para fazer seu retiro anual, além de passar quinze dias com as Irmãs para descansar, seguir a vida religiosa delas e oferecer-lhes alguns de seus serviços (costura, limpeza da casa, louça e jardim).
Doença e Morte
A Irmã Maria Jacinta tinha pedido toda a sua vida o dom da perseverança final na amizade de Jesus (a quem familiarmente chamava “Meu amigo Jesus”) e em sua santa vocação. Já em um bilhetinho que escreveu em 1950, na festa de 19 de março, São José, pode-se ler estas palavras, como que postas na boca deste celestial Patrono:
“Filha minha, deixo-te meu amor, minha puríssima Esposa.
Terá a graça da perseverança final, e a especial proteção de Maria Santíssima.
Teu Protetor, São José”.
Sim, esta graça devia alcançar nossa querida Irmã. Encontrando-se no Priorado de Buenos Aires, teve que ser internada repentinamente no hospital em meados de junho de 2001, por dores agudas nos intestinos. Foi detectado um câncer no sistema linfático, recebendo pela primeira vez o sacramento da Extrema Unção, administrado pelo Padre Rubio. Os Padres do Priorado de Buenos Aires levavam-lhe diariamente a Sagrada Comunhão, preocupando-se por sua atenção espiritual. Depois de duas operações, se repôs favoravelmente, de modo que lhe dera alta e a moveram ao Noviciado Santa Teresinha, das Irmãs de Pilar. Aí passou com elas todo o mês de julho, e seus últimos 27 dias de agosto (salvo pelo período de uma semana, em que teve que ser internada de novo no hospital para observação, entre os dias 6 e 14). De volta ao Noviciado, a Irmã Maria Jacinta foi realmente mimada pela Divina Providência:
- pôde fazer uma confissão geral de toda a sua vida, com grande consolo seu;
- pôde renovar sua profissão de fé mediante o rezo do símbolo Quicumque, seus votos de religião e sua consagração à Santíssima Virgem em qualidade de filha e escrava;
- recebeu a bênção com indulgência plenária in articulo mortis (lhe foi dada em várias ocasiões);
- não se desprendeu nem um só momento (nem sequer no hospital, onde o defendeu com unhas e dentes) de seu querido Escapulário do Carmo;
- rezou várias vezes (pelos vários alarmes de morte iminente) a recomendação da alma;
- e sobretudo (graça que lhe confortou muitíssimo) pôde morrer entre religiosas, em uma casa religiosa, acompanhada pela caridade e a dedicação das Irmãs da Fraternidade: graça que o Senhor lhe fez, seguramente, para compensá-la da solidão que teve que sentir nos momentos em que, para permanecer fiel a sua vida religiosa nas aplicações das reformas conciliares, teve que optar por retirar-se de sua querida Congregação.
Praticou durante estes últimos dias, segundo o testemunho das Irmãs que a atenderam, as virtudes que tanto tinha pedido durante sua vida: obediência, humildade, grande respeito pelos sacerdotes e por toda autoridade, abandono nas mãos de Deus. Pedia perdão ao Senhor por seus pecados, e sua divina misericórdia. As Irmãs dizem que até 15 de agosto, festa da Assunção de Nossa Senhora, pareceu ver nela certa resistência, natural e instintiva, a morrer (uma espécie de vontade de viver); mas a partir de 15 de agosto, quando fez a segunda recomendação da alma, já desfrutou de um grande abandono interior, de desejos de morrer e de se ver livre de seu corpo, para voar a Deus.
A Irmã Maria Jacinta faleceu em 27 de agosto de 2001, às 16:15 horas, depois de extinguida suavemente sua vida. A Missa de funerais foi celebrada no dia seguinte, no Priorado de Buenos Aires, pelo Reverendo Padre Xavier Beauvais, e seus restos foram enterrados no cemitério do Seminário Nossa Senhora Corredentora, onde esperam a ressurreição dos corpos.
A Missa de Réquiem no Priorado São Pio X de Buenos Aires: o corpo da Irmã chega transportado pelos Reverendos Padres Juan José Turco, Arturo Vargas (capelão de Pilar) e Juan Carlos Ceriani.
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