Em 1º de janeiro de 2011, por ocasião da oração do Angelus, o Papa Bento XVI anunciou sua intenção de renovar a cerimônia inter-religiosa de Assis, de 27 de Outubro de 1986:
“No próximo mês de Outubro, irei como peregrino à cidade de são Francisco, convidando os irmãos cristãos das diferentes confissões, os expoentes das tradições religiosas do mundo e, idealmente, todos os homens de boa vontade, a unir-se neste caminho com o objetivo de recordar aquele gesto histórico desejado pelo meu Predecessor e de renovar solenemente o empenho dos crentes de cada religião a viver a própria fé religiosa como serviço para a causa da paz”.
Ele já o havia anunciado em sua mensagem para a Paz para o ano 2011, intitulada: “A liberdade religiosa, caminho para a Paz”. Escreveu: “Em 2011, tem lugar o 25º aniversário da Jornada Mundial de Oração pela Paz, que o Venerável Papa João Paulo II convocou em Assis em 1986. Naquela ocasião, os líderes das grandes religiões do mundo deram testemunho da religião como sendo um factor de união e paz, e não de divisão e conflito. A recordação daquela experiência é motivo de esperança para um futuro onde todos os crentes se sintam e se tornem autenticamente obreiros de justiça e de paz.”
Sabemos, no entanto, que o Papa Bento XVI, enquanto ainda Cardeal, não quis assistir a esta “jornada de orações inter-religiosas para a paz”, devido ao risco de sincretismo em uma tal jornada. Ele também desejou, desde que está sobre a sede de Pedro, duas vezes, dar precisões sobre esta jornada, talvez nessa perspectiva de aniversário.
Em uma mensagem dirigida ao bispo de Assis, em 2 de Setembro de 2006, escrevia: “Para que não haja dúvidas acerca do sentido de quanto, em 1986, João Paulo II quis realizar, e que, com uma sua expressão, se costuma qualificar como “espírito de Assis”, é importante não esquecer a atenção que então foi dada para que o encontro inter-religioso de oração não se prestasse a interpretações sincretistas, fundadas numa concepção relativista. [...] Por isso, mesmo quando nos encontramos juntos a rezar pela paz, é necessário que a oração se realize segundo aqueles caminhos distintos que são próprios das várias religiões. Esta foi a escolha de 1986, e tal escolha não pode deixar de ser válida também hoje. A convergência do que é diverso não deve dar a impressão de uma cedência àquele relativismo que nega o próprio sentido da verdade e a possibilidade de a obter”.
Mas, como simples observação: ele não rezou com os judeus e rabinos da sinagoga de Roma por ocasião de sua última visita? Umas são palavras. Outras as atitudes.
E, em visita a Assis, em 17 de junho de 2007, o Papa declarou, outra vez, em sua homilia: “A escolha de celebrar aquele encontro em Assis era sugerida precisamente pelo testemunho de Francisco como homem de paz, para o qual muitos olham com simpatia também de outras posições culturais e religiosas. Ao mesmo tempo, a luz do Pobrezinho sobre esta iniciativa era uma grande garantia de autenticidade cristã, dado que a sua vida e a sua mensagem se baseavam tão visivelmente sobre a escolha de Cristo, que rejeitavam a priori qualquer tentação de indiferentismo religioso, que em nada se relacionaria com o autêntico diálogo inter-religioso. [...] Não poderia ser atitude evangélica, nem franciscana, não conseguir conjugar o acolhimento, o diálogo e o respeito por todos com a certeza de fé que cada cristão, do modo como o Santo de Assis, é obrigado a cultivar, anunciando Cristo como caminho, verdade e vida do homem (cf. Jo 14, 6), único Salvador do mundo”.
As intenções de Bento XVI são nítidas e honestas… mas não podem impedir, de jure, o risco de sincretismo, relativismo e indiferentismo. Como disse muito bem Romano Amerio, em seu livro “Stat Veritas”, “Não são mais do que palavras… não se pode promover o sincretismo e em seguida advertir que é necessário ter cuidado para evitar evitar o sincretismo” (p. 139).
Não é, tampouco, porque esta reunião ocorre em Assis, onde o Poverello imprimiu sua marca de sua entrega a Cristo, que esta reunião é, de si, garantida por uma justa ortodoxia. É possível ser infiel em Assis.
Além disso, em 27 de outubro de 1986, com João Paulo II, talvez, desejou-se ter “atenção para que o encontro inter-religioso de oração não se prestasse a interpretações sincretistas”, procurando que “a oração se realize de acordo com os caminhos distintos que são próprios das várias religiões”. Talvez tenha sido um desejo leal. Tal desejo não foi e não pôde ser realizado, de modo que é possível falar, a justo título, de jornada pan-cristã de Assis ou de “a ilusão pan-cristã de Assis”.
Com efeito, em Assis, no dia 27 de outubro de 1986, os católicos não rezaram como, por sua vez, os “representantes das outras religiões”, de acordo com os seus próprios ritos e na plena “expressão de sua própria fé”, como deixa entender Bento XVI, mas reuniram-se em “oração ecumênica” com “representantes das confissões e comunidades cristãs” na catedral de São Rufino. Isso foi claramente afirmado pelo Osservatore Romano de 27-28 de outubro de 1986. Lá, o Papa, despojado de toda insígnia de sua primazia, pôs em marcha, sempre na sua qualidade de anfitrião — como será Bento XVI, em 27 de outubro próximo –, uma celebração tipicamente protestante com leitura de passagens da Bíblia, mesclada com cantos e sendo concluída pela “oração universal”, aquela “de toda a Igreja”. Encontrareis este testemunho no Osservatore Romano citado, na página 3.
A saudação dirigida à assembléia, lida pelo “anfitrião” João Paulo II, falou, sem dúvida, das “graves questões que ainda nos separam”. Mas disse também que “o grau atual de nossa unidade em Cristo é, não menos, um sinal para o mundo de que Jesus Cristo é realmente o Príncipe da Paz”. Mais ainda, concluiu que a oração pela paz “deve fazer crescer em nós o respeito de uns pelos outros como seres humanos, como Igrejas e comunidades eclesiais” (Ibid, e DC.n° 1929 do 7 de Dezembro de 1986).
Nenhuma outra distinção, que não seria justificada por seu papel “anfitrião”, foi reconhecida ao Papa pelo cerimonial ecumênico. O que escandalizaria de tal modo Dom Lefebvre que veria ali uma injúria ao Vigário de Cristo. E ainda, a oração final dos “pan-cristãos” na praça da basílica menor de São Francisco foi iniciada por uma mulher “pastora”, enquanto o Papa era apenas o quarto “entre tanto sábios”.
Inoportunamente, no dia seguinte do “encontro de Assis”, o Cardeal Etchegaray declarava: “Para mim, a oração da Igreja cristã na catedral de São Rufino foi o momento, o tempo forte, de toda a jornada… A qualidade e a intensidade desta oração foi aquela em que todos pareciam iluminados como que por uma nova efusão comum do Espírito Santo”. Ele se exprimia assim “ridícula, sentimentalmente” no jornal Avvenire, de 2 de novembro de 1986. Recordamos que ele foi o grande organizador da jornada de Assis. É forçoso reconhecer que, na Babel de Assis, os Cardeais e o próprio Papa, de fato, não representaram a Igreja Católica, mas a “Igreja cristã”, englobando aí os não católicós. E quem eram aqueles que compunham esta “Igreja cristã”, que teria tido seu Pentecostes em Assis, segundo a declaração do Cardeal Etchégaray? As “diversas Igrejas e confissões que têm Cristo por fundamento”, explicava-nos o Osservatore Romano, de 27-28 de outubro de 1986. Na prática: a igreja ortodoxa, as “igrejas” reformadas e a Igreja Católica. Evidentemente, esta “Igreja cristã” não era a Igreja Católica, mas uma super-igreja que ultrapassa e inclui a própria Igreja Católica, do mesmo modo que as outras supostas “igrejas”. Que eclesiologia!
Com efeito, a oração da “Igreja cristã” em Assis não foi a da Igreja Católica, cuja fé se exprime plenamente na Santa Missa, “sacrifício verdadeiro e autêntico”, como ensina o santo Concílio de Trento contra os autores dessas “confissões e comunidades cristãs” reunidas com os católicos em São Rufino. Logo pela manhã de 27 de outubro o Papa João Paulo II celebrou o rito da nova missa, em Perugia, antes de se dirigir a Assis, cujo cerimonial foi ecumenicamente misturado com o de seus “irmãos separados” — e isso Bento XVI, apesar da sua intenção, não poderá fisicamente evitar — para rezar “ecumenicamente” com eles e “sem triunfalismo”, despojado da dignidade do Vigário de Cristo, esquecendo que a Igreja Católica não é senão uma com Cristo, que deve reinar eternamente sobre todas as coisas, todos os bens e todos os seres. Isso lhe cabe de direito divino. Mas isso não poderá ser confessado pelo Papa. No entanto, é sua função!
E mais ainda, em Assis, a Igreja Católica foi posta não no nível das falsas religiões, que dizem-se cristãs ou não, mas abaixo delas. Recorde-se que o Cardeal Etchégaray permitiu a todos “se exprimir na plenitude de sua própria fé” (CD de 7-21 de setembro de 1986), mas isso não foi permitido aos católicos; “que a oração de cada um fosse respeitada”, mas a dos católicos não foi. E quando, pondo em marcha o carrossel final sobre a praça ao pé de São Francisco, declarou triunfantemente: “Estamos reunidos em plena fidalide às nossas tradições religiosas, profundamente conscientes da identidade de cada um de nossos compromisso de fé” (OR citado, p. 4). Era verdadeiro para todos, exceto para os católicos, nem em sua oração nem em seu Pontífice, Ele, no entanto, Vigário de Cristo…
Enfim, enquanto foi concedido aos representantes das falsas religiões, com grande atenção, reunirem-se de acordo com o seu desejo “para rezar, mas sem rezar juntos” (Rádio Vaticano), os representantes oficiais da única religião verdadeira rezaram juntos com os representantes das falsas religiões pseudo-cristãs. A prática pan-cristã de Assis é suficiente para demonstrar que, entre outras coisas, bastaram vinte anos de falso ecumenismo para que se estabelecesse entre os católicos, a começar pela sua hierarquia, o indiferentismo pan-cristão. Hoje, tudo parece legítimo.
Por todas essas razões, a “jornada de Assis” não pode ser renovada nem ser comemorada; ela não é “comemorável”; ela não é digna da Igreja Católica, ela é “miserável”.
Fonte: Fratres in Unum
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